A principal rua de Formosa tem o nome de Rua Visconde de Porto Seguro em homenagem à essa história vivenciada aqui por Francisco Adolfo de Varnhagen.
Em 1877, Francisco Adolfo de Varnhagen, o Visconde de Porto Seguro realizou uma viagem ao Planalto Central para conhecer
melhor a região e apontar, com mais propriedade, um local ideal para a
transferência da capital. Exatamente no dia 28 de julho de 1877, o Visconde de
Porto Seguro escreveu um ofício ao Ministro da Agricultura, Conselheiro Tomás
José Coelho de Almeida, no qual Relatou o êxito da viagem e da pesquisa, indicando
o triângulo formado pelas três lagoas como um dos melhores locais para a
transferência da capital.
De acordo com a monografia hospedada em http://bdm.unb.br/bitstream/10483/4311/2/2012_JulianaRodriguesFreitas.pdf, vemos o que se trata abaixo:
Para comprovar pessoalmente se a localização que os mapas indicavam era, de fato, a
mais apropriada geograficamente para receber a capital do Império, em 1877, Francisco
Adolfo de Varnhagen – neste período já com o título de Visconde de Porto Seguro – pede,
oficialmente, ao Governo licença de seis meses do cargo que ocupa como embaixador do
Brasil em Viena, na Áustria. Oficialmente, esta licença seria para encontrar novas localidades
para o fluxo de imigrantes europeus que chegavam ao Brasil e, encaminhavam-se,
prioritariamente, para o sul do país. Todavia, Varnhagen aproveitou-se da viagem para atestar
o que já em 1839 começara a defender: a transferência da capital para uma região central do
país. E, dia 28 de julho de 1877, escreve da Villa Formosa da Imperatriz – atual município de
Formosa – para o Ministro da Agricultura uma carta na qual discorre sobre as melhores
localidades para estabelecimento dos imigrantes europeus. A carta iniciava-se: “Villa
Formosa da Imperatriz, província de Goiaz, 28 de julho de 1877. Ilmo. Exmo. Sr. Para melhor
cumprir as ordens que V. E. se dignou dar-me em Aviso desse ministério de 14 de junho
último...” (VARNHAGEN, 1877: 26).
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Durante 15 dias, Varnhagen ficou hospedado em Vila Formosa da Imperatriz e, em
suas andanças pela região, comprovou tudo o que havia buscado em seus mapas e
documentos. Segundo Luiz Ricardo Magalhães, em sua dissertação de mestrado, Varnhagen
viu “tudo aquilo que queria ver”, já que afirmava que encontrou aqui os ares mais finos da
Europa (2004).
Varnhagen foi, de todos os idealizadores da capital até então, o que mais longe
conseguiu ir. Em 1877, o aristocrata, engenheiro, matemático, historiador, diplomata e
Visconde de Porto Seguro, embrenhou-se na fadigosa viagem ao centro do pais de dimensões
continentais e visitou a pequena Vila Formosa da Imperatriz. Com idade avançada (para os
padrões do século XIX), 61 anos, estava obstinado em busca de sua eternização no coração da
nação que se constituía. Varnhagen queria encontrar o lugar que procurava e “proceder a
união entre teoria e empiria para conceber o lugar ideal, o coração do Brasil, e definir sua
própria ascensão ao desejado limbo do reconhecimento nacional” (MAGALHÃES, 2004: 57).
Em 29 de junho de 1878 – exato um ano depois de redigir a carta ao Ministro da
Agricultura, em Vila Formosa da Imperatriz –, Varnhagen faleceu em virtude de uma
pneumonia em Viena, na Áustria. Foi sepultado em Santiago do Chile, à pedido de sua
esposa, a chilena Carmem Ovalle. Seus restos mortais estão depositados no monumento a
Varnhagen, na Avenida General Osório, em Sorocaba. Na placa deste monumento constam os
seguintes dizeres: “Estão aqui depositados os restos mortais de Francisco Adolfo de
Varnhagen, Visconde de Porto Seguro. Paulista de Sorocaba, o Pai da História do Brasil *17-
2-1816 † 29-6-1878. Transladados de Santiago, Chile, no centenário do falecimento. Prefeito
Municipal Theodoro Mendes. Sorocaba, 29-6-1978”.
Seguindo os estudos, a transcrição fiel da carta está hospedada no site http://doc.brazilia.jor.br/HistDocs/Relatorios/1877varnhagenFormosa.htm, conforme segue abaixo em sua íntegra:
Varnhagen, 1877
Ofício ao ministro da Agricultura
Villa Formosa da Imperatriz, em Goyaz, 28 de Julho
de 1877.
Illmº Exmº Sr.
Para melhor cumprir as ordens que V. E. se dignou
dar-me em Aviso desse ministerio de 14 de Junho último, começarei por consignar
por escripto algumas idéas que, acerca da colonizaçâo européa no Brazil, tive a
honra de emittir verbalmente na audiencia que V. E. se dignou conceder-me
poucos dias antes da data do mencionado Aviso.
Varios resultados menos favoraveis a esse respeito,
nos climas tropicaes do nosso littoral, fizeram que hoje tenha quasi unanimemente
triunfado na Europa a idéa de que, para o primeiro estabelecimento dos colonos
do norte no nosso paiz, só sâo apropriados os climas do Rio Grande do Sul, e
quando muito os de algumas paragens das de Santa Catharina e Paraná; de modo
que é quasi exclusivamente para estas provincias que a mesma colonizaçâo ja
segue expontanea, dispensando a estipendiada; com a qual, nâo só por espirito
de equidade e justiça, como por outras muitas consideraçôes, bem conhecidas de
V. Ex., conviria que fossemos presenteando as demais provincias.
Se o clima do Rio Grande do Sul, no littoral, é mais
fresco e analogo aos da Europa que os das demais provincias, nâo é menos certo
que, no interior destas ultimas, ha chapadôes mui elevados, em que a
temperatura é igualmente benigna, e em que no inverno caem até as folhas á
maior parte das arvores. É mui conhecido o principio, com as proporçôes até
designadas por Humboldt, de que a identidade da temperatura se opera nas mais
baixas latitudes pela ascensâo das altitudes; e isto a tal ponto que, debaixo
da equinocial, nas immediaçôes de Quito por exemplo, ha neves perpetuas. E bem
conhecidos sâo entre nós como muito mais frescos que os do litoral, na
provincia do Rio de Janeiro, os climas de Petropolis e da Nova Friburgo, em
paragens elevadas mais de oitocentos metros, e na de S. Paulo, mais ao sul,
como muito mais frescos que os de Santos, os da capital e mais cidades, de
serra-acima, em alturas além de sete centos metros. Assim, por via de regra,
quanto mais baixa for a latitude do logar maior deverá ser a sua altitude para
que o clima seja fresco e de natureza menos tropical, a ponto de nâo fazer
esmorecer os colonos ao ver, ao cabo de alguns mezes, desbotarem-se a seus
filhos das faces as côres rosadas com que haviam partido da Europa. E se nas
latitudes de 22º a 24º sâo para isso mais que sufficientes elevaçôes de 700 a
800 metros, em menores latitudes é claro que essas alturas deverâo ser maiores.
E o mais é que estes climas mais frescos sâo ás vezes até designados pela
propria vegetaçâo, que cessa de ser de mattas virgens, e passa a cerrados e a
campos limpos, mais apreciados pelos colonos que nâo tem as prevençôes da nossa
gente de que só sâo perfeitamente productivas as mesmas mattas; as quaes elles
colonos apreciam em menos, por sua antipathia ás derribadas, preferindo antes
plantar e semear desde logo em campos já mais ou menos araveis.
Em conformidade com estes principios, começarei por
indicar uma regiâo das provincias de S. Paulo e Minas que, pela bondade do
clima e das terras e pela muita facilidade com que a ella se poderá chegar,
terminada que seja a estrada de ferro da Casa Branca, podia fornecer muitas
localidades mui apropriadas para centros ou povoaçôes de colonos europeus
recem-chegados. Esta regiâo estende-se pelos capadôes quasi sem arvores, de
terra vermelha, com pastos de barba-de-bode, elevado mais de 900 metros, que se
encontra desde antes da cidade de Franca, abrange os das duas margens do rio
das Velhas, afluente do Par[a]nahiba, e comprehende toda a extensâo logo abaixo
das cabeceiras dos afluentes do Quebra-anzol e mesmo Par[a]nahiba, ao poente
das serras da Canastra e da Mata da Corda. Os chapadôes sâo por ahi de tâo
pequenas pendentes que, com a introduçâo nelles de alguns arados centraes a
vapor, de grande força, de repente se poderiam pôr ao sol, reunir em montôes e
logo queimar para estrume, como se faz na Europa, as touceiras do dito capim;
quer para depois semear trigos, quer prados artificiaes de alfafa, havendo meio
de regal-os, quer finalmente de capim gordura, ou melloso, ou qualquer outra
das especies que dâo expontaneas em outras paragens do sertâo.
Na vasta extensâo que acabo de percorrer, ha porém
outra regiâo nâo menos apropriada a offerecer localidades favoraveis ao
primeiro estabelecimento de colonos europeos, e a respeito da qual julgo que
deveriamos desde ja dar algumas providencias, afim de a ir preparando para a
missâo que a Providencia parece ter-lhe reservado, fazendo a um tempo della
partir aguas para os tres rios maiores do Brazil e da America do Sul, Amazonas,
Prata e S. Francisco, e constituindo-a, por assim dizer, o nucleo que reune
entre si as tres grandes concas ou bacias fluviaes do Imperio. Refiro-me á
bella regiâo situada no triangulo formado pelas tres lagoas Formosa, Feia e
Mestre d'Armas, com chapadôes elevados mais de mil e cem metros, sobre o mar,
como nella requer para a melhoria do clima a menor latitude, com algumas terras
mais altas do lado do norte, que nâo só a protegem dos ventos menos frescos
desse lado, como lhe offerecerâo os indispensaveis mananciaes.
Nâo entrarei aqui, Exm. Sr., na questâo da alta
conveniencia para o Imperio e até para o Rio de Janeiro, da mudança da capital,
questâo que me reservo discutir de novo extensamente em uma publicaçâo nâo
official. Mas nâo posso deixar de aproveitar esta occasiâo para recommendar a
importancia, em todo o sentido, da mencionada paragem, como solo fecundo em que
tem de vingar e prosperar muito quaesquer sementes que nelle se lançarem.
Nestes terrenos de campos elevados, de bellas pastagens, onde se criam
perfeitamente os cavallos companheiros da civilizaçâo do homem (e que se pagam
hoje apenas a trinta e quarenta mil reis cada um), onde os cafezeiros, ao cabo
do primeiro anno da planta da muda, já produzem prodigiosamente, promettendo
para quando houver daqui communicaçôes ser este um novo districto deste genero,
nestes terrenos, digo, com bosques nos valles e margens dos ribeirôes, se
encontram para as construcçôes de edificios, muito bons grés brancos e
vermelhos e até marmores de côres, os quaes hoje apenas se destinam para cal, e
se encontra tambem, como por todo o sertâo, bastante minerio de ferro;
existindo até bem perto em actividade uma fabrica pertencente ao major José
Rodrigues Chaves, a qual, por meio do modesto processo dos fornos catalâes, o
funde, fornecendo para todas as emmediaçôes muito bom ferro. Para rebentar a
pedra facil seria fazer-se até polvora, com o muito salitre que fornece a
visinha serra das Araras.
Entre outras localidades apropriadas ao
estabelecimento de povoaçôes que ainda se poderâo encontrar nesta regiâo, unica
em relaçâo ao Brazil todo, eu cheguei a reconhecer pessoalmente duas, bastante
elevadas, de facil accesso, bem ventiladas, suaves, escoantes, bellos
horizontes e com capacidade sufficiente para estender-se e chegar a receber até
mais de um milhâo de almas.
É uma dellas a chapada, por alguns denominada serra
da Gordura, perto de quatro leguas a O. N. O. desta villa, na paragem onde, a
menos de um tiro de fuzil umas das outras, se veem as cabeceiras dos ribeirôes
Santa Rita, vertente ao rio de S. Francisco pelo Preto; Bandeirinhas, vertente
ao Amazonas, pelo Paranan e Tocantins; e Sitio-Novo, vertente ao Prata, pelo S.
Bartholomeu e grande Paraná.
A outra fica apenas legua e meia a N. O. desta
ultima, e lhe é, no meu entender, mui superior; tanto por ser ainda mais alta,
e ventilada e de mais bellos horizontes, como pela facilidade de conduzir a
ella as aguas potaveis, apanhando logo acima as varias aguas verentes á Lagoa
Formosa e ribeirâo do Bahú. Refiro-me a uma localidade no dorso do espigâo que
forma o paredâo da Lagoa Formosa ao lado de leste, na subida que conduz á
chamada serra do Cocal; em um sitio abundante de planta aqui denominada com o
nome de yucas. A differença de nivel para menos do alto da serra do Cocal, nâo
só permittiria o apanhamento e a facil conducçâo de aguas das ditas vertentes,
com as quaes se poderia desde logo encher a primeira caixa ou mâe d'agua, em
quanto a povoaçâo se nâo estendesse muito e fosse necessario ir buscar mais ás
serras mais distantes, como tambem a abrigaria completamente dos nortes, que,
como disse, sâo os ventos menos frescos e menos sadios da America do Sul; e
desse modo soprariam mui por cima das casas.
Nâo falta, Exmº Sr., quem nutra aprehensôes, de que,
nestas paragens, todos os mananciaes produzem o bocio ou papeira, e eu era dos
que partilhavam esses receios antes de aqui vir. As observaçôes porém que tenho
feito, e as investigaçôes a que tenho procedido, apoiadas nas que já fizera o
sabio academico francez Boussingault na Colombia, me deram a intima convicçâo
de que a causa de semelhante enfermidade nos chapadôes apenas habitados junto
ás cabeceiras dos córregos ou olhos d'agua, nâo é outra senâo a de serem essas
aguas, em geral junto ás nascentes, mui carregadas de certos saes e nâo
convenientemente batidas e arejadas, condiçôes uma e outra que só perdem por
meio da distancia dos encanamentos feitos com pedra ou tijolo; os quaes, se ha
altura sufficiente, se fazem com pequenas caxoeiras ou saltos, e nâo ha, com fundo
desigual, onde a agua va saltitando e arejando-se. No encanamento das
Aguas-livres em Lisboa, ha dois canaes paralellos, dos quaes somente um serve,
em quanto se limpa o outro, donde, ao cabo de algum tempo, se tiram como telhas
de sarro ou sedimento deixado pelas aguas. Ora, nos nossos sertôes, o facto das
virtudes dos encanamentos distantes se comprova pela propria experiencia: pois
nâo adquirem papos os individuos que bebem, já nos ribeirôes, das mesmas aguas
que os deram aos que dellas beberam nas nascentes, especialmente se estas tem
logar em terrenos de certa argila schistosa.
Cingindo-me agora ao supra mencionado Aviso de V.
Ex. de 14 de Junho, cumpre-me tratar das communicaçôes, e da maneira como desde
já os colonos e todos os aviamentos poderiam ser até essas paragens
transportados. Nada mais facil do que tirar partido dos proprios meios de
conduçâo hoje empregados, desde o extremo da estrada de ferro da provincia de
S. Paulo, que sem demora chegará á Casa Branca. Por onde vâo carros de sal, levando
ás vezes mais de cento e vinte arrobas de peso, e tendo as rodas fixas ao eixo,
bem poderâo ir caravanas de carroças de quatro rodas como as da Companhia Uniâo
e Industria, com toldos, puchada por menos juntas de bois, conduzindo familias
dos colonos e sendo estes os proprios carroceiros, apeando-se todos os
individuos nos passos dificeis e trabalhando juntos por arrancar e aplanar
qualquer irregularidade causada pela chuva precedente. O caminho por Uberaba é
todo de chapadôes, sanissimo e os pastos para os bois bastante bons e
gratuitos. Uma junta de bons bois nâo custa aqui muito mais de 50$00 r., e uma
vacca de açougue 16 a 18; de modo que a carne é mui barata, e a caça nâo falta,
nem peixe nas tres lagoas visinhas, e das fructas do paiz se poderia obter
muito bons vinhos.
Em todo caso, Exmº Sr., uma paragem, da importancia
desta, que, pela bondade de seu clima e sua fertilidade, recommendaria no
estrangeiro o Brazil todo, que pela sua posiçâo favoreceria notavelmente o
desenvolvimento do commercio interno de todas as provincias, e que (quando
viesse a ser a séde do governo) afiançaria nos seculos futuros a segurança e
unidade do Imperio, parece-me que é digna de merecer desde já a devida attençâo
dos poderes publicos do Estado, fazendo convergir para ella todas as
communicaçôes, começando pela continuaçâo da estrada de Pedro 2º, levando-a
talvez de preferencia pelo Paraopeba, rio S. Francisco e Urucuya, cujas
cabeceiras se acham mui perto desta villa. Tambem a linha de Casa Branca se
poderia desde já para esta paragem encaminhar, seguindo algumas vertentes, a
buscar, pelo caminho mais facil, a foz do Corumbá no Par[a]nahiba, para subir
depos aquelle rio e o S. Bartholomeu, até as cabeceiras deste. Eu julgo, Exmº
Sr. que, se fosse necessario, até por uma lei applicavel ás proprias estradas
de ferro provinciaes, deviamos de todo abandonar o systema de as decretar e
conceder para unir entre si povoaçôes ainda de insignificante commercio e
trafico, com grandes gastos de aterros e desaterros, aplanando montes e valles,
e que nos conviria adoptar de preferencia o principio de ir beirando os rios,
sem nenhuns gastos de nivellamento, e com muito maior proveito da agricultura
em geral, como succede á que segue o valle do Parahiba. E creio firmemente que
nesta quasi preferencia das margens dos rios, ajudando assim a natureza, que se
limitou a abrir os leitos, mais ou menos nivellados, deixando caxoeiras, que
mais custaria a quebrar do que a vencer lateralmente pelas estradas de ferro,
está o grande segredo do desenvolvimento das mesmas estradas de ferro no
Brazil; pois novas cidades, muito mais importantes que as actuaes, poderâo vir
a surgir ao lado dellas como por encanto. Isto nâo obstaria a que a dessas
grandes arterias se fizessem divergir ramaes para as cidades visinhas, mais ou
menos importantes. Deus guarde" etc.
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